sábado, 2 de abril de 2011

Eu não sei criar títulos.

(Cartier-Bresson)

O sol forte na rua foi pretexto para eu entrar. Sempre encontro. Livrarias e motivos para entrar. Posso procurar livros esgotados na editora. Ou fico só olhando quem procura o quê. Será que alguém percebe os títulos que carrego? As pilhas que folheio na mesa do café?

Dei uma volta na literatura brasileira, passei pelo caixa e olhei aquelas duas meninas. Curiosas, a gente via de longe. O ruído dos recém adolescentes perto dos discos não chegava no mundo que elas estavam. Era quase outra galáxia. 

Acho que elas fazem parte da sociedade de famílias que levam os filhos ao shopping no sábado. Pelo menos essa parte do passeio era meio didática, construtiva, digamos assim. Poderiam ser irmãs, mas a idade era muito parecida. Não eram gêmeas. E também eram cúmplices demais para isso. Adivinho: é a melhor amiga, que a mãe deixou na casa da fulaninha para passar o dia e dormir lá, caso tenha sorte e seja bem comportada. Ok.

Tento conter a vontade de sorrir quando o carinha do caixa pergunta o que está escrito na minha tatuagem. Fingi uma seriedade sobrenatural. Sem conseguir olhar para cima, errando a senha do cartão, eu respondo.

- É que eu não conto para ninguém. 

Todo mundo acha que é árabe. E acha que a mensagem é algo mais sobrenatural que a seriedade ali de cima. E falar seria acabar com isso tudo, porque o que está escrito é mais simples que digitar a senha do cartão. Sem errar, claro. 

Eu prefiro deixar as pessoas pensarem o que querem. Que é o nome do meu ex namorado de sete anos atrás, que eu não consegui apagar dos poros. Ou então uma frase feita. Ou sei lá, homenagem a alguém que morreu. Conforme o contexto, a tatuagem vai mudando a sua linguagem. Um dia desses eu mesma vou ter que me perguntar o que é. Espero que responda. 

Vou em direção à porta. E é nessa hora que as meninas passam por mim. 

As cores que elas vestem misturam-se às capas espalhadas pelo lugar. Elas carregam dezenas de livros que parecem não ter peso nenhum. A mais esperta olha para a outra. E como se fosse um segredo, revela.

- Sabia que se a gente colocar a letra G antes de astronomia, vira gastronomia?

Chego em casa ainda me perguntando onde foi a gente deixou a leveza de tentar entender as palavras.

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